EEmmanuel Macron, que foi eleito confortavelmente para a presidência com o apoio de quase todos os meios de comunicação franceses, exigiu que a sua maioria parlamentar lhe fornecesse uma lei contra as “notícias falsas” durante as campanhas eleitorais. Talvez ele esteja se preparando para o próximo.
O projecto de legislação revela tanto a cegueira daqueles que governam quando desafiados e sua inclinação para inventar novas contramedidas coercivas. Seria preciso ser míope para acreditar que a vitória de candidatos, partidos e causas “anti-establishment” (Donald Trump, o Brexit, o referendo catalão, o Movimento Cinco Estrelas de Itália) poderia, mesmo que marginalmente, ser a consequência da propagação de regimes autoritários notícias falsas. A imprensa norte-americana tenta demonstrar há um ano, ainda sem provas conclusivas, que Trump deve a sua eleição às notícias falsas fabricadas por Vladimir Putin.
Macron tem uma obsessão semelhante, ao ponto de esperar fazer desaparecer as notícias falsas com uma lei que é ao mesmo tempo inútil e perigosa. Inútil porque o Conselho de Estado francês salientou, em 19 de Abril, que «a lei francesa já contém diversas medidas destinadas a combater a difusão de informações falsas»: em particular a lei de 29 de Julho de 1881 sobre a liberdade de imprensa, que permite restrições à difusão de informações falsas e a expressão de pontos de vista difamatórios ou abusivos ou que incitam ao ódio.
E perigoso porque o projecto de lei prestes a ser apresentado ao parlamento exigiria que um juiz actuasse no prazo de 48 horas para “parar a disseminação artificial e em grande escala de notícias que constituem informação falsa”. Mas, continuou a resposta do Conselho de Estado, “estes são difíceis de determinar legalmente, especialmente quando o juiz deve proferir uma decisão num prazo muito curto”. A lei de Macron também reforçaria o dever de cooperação dos fornecedores de serviços de Internet e dos anfitriões com as autoridades, uma vez que se estende a todas as restrições a informações falsas que inicialmente visavam prevenir o “apologismo por crimes contra a humanidade, o incitamento ao ódio e à pornografia infantil”.
A propriedade dos meios de comunicação social pelos amigos bilionários do presidente, as alegações de publicidade tóxica e a supressão do financiamento dos canais de televisão públicos não são objecto de qualquer projecto de lei. E porquê limitar este aparato judicial à época de campanha? Nas últimas décadas, em quase todas as guerras – no Golfo, no Kosovo, no Iraque e na Líbia – houve uma proliferação de mentiras e manipulação de notícias. Não pela Rússia, pelo Facebook ou pelas redes sociais, mas pelos nossos faróis de democracia e jornalismo: os principais jornais diários ocidentais, com o New York Times na vanguarda, a Casa Branca e as capitais europeias. Já para não falar do governo ucraniano, que anunciou deliberadamente a falsa morte de um jornalista no mês passado. Se um juiz precisar ordenar a prisão dos responsáveis pela divulgação dessas notícias falsas, pelo menos eles serão fáceis de encontrar…
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