Wall Street acordou um pouco triste esta manhã, pela sua candidata favorita nas eleições presidenciais do Brasil, Marina Silva, ter ficado em terceiro lugar. Isto significa que a votação do segundo turno, marcada para o final deste mês, em 26 de outubro, será entre a atual candidata do Partido dos Trabalhadores, Dilma Rousseff, e o tecnocrata neoliberal Aécio Neves. Dilma Rousseff é, a partir de agora, a favorita para vencer.
Nos últimos dois meses, os mercados financeiros deixaram claro que queriam que Silva fosse o próximo presidente do Brasil. Eles realmente a queriam. Há um mês, quando Silva subia inesperadamente nas sondagens, prevendo-se que venceria, o mercado de ações do Brasil disparou, subindo quase 7 por cento. Investidores animaram o Brasil reais, por um curto período de tempo fazendo isso “a principal moeda com melhor desempenho do mundo nas três semanas após Silva ter anunciado sua candidatura em 16 de agosto e as pesquisas a terem mostrado na liderança. "
Mas então Dilma se recuperou nas pesquisas e o amor desapareceu. Na semana passada, os lobos de Wall Street exerceram o seu “veto”, punindo tanto a moeda brasileira como o mercado de ações. O reaiscaiu para o nível mais baixo em seis anos e as ações sofreram a pior queda diária em três anos. Os brasileiros estão acostumados com esse tipo de coisa. Isso aconteceu todas as vezes que o antecessor de Dilma, Luiz Inácio Lula da Silva, concorreu à presidência (1989, 1994 e 1998) até que, na disputa de 2002 que finalmente venceu, assinou um compromisso com o Fundo Monetário Internacional de que manteria um excedente orçamental e não renegar a dívida externa. Desta vez, porém, não foi suficiente para salvar Silva.
Leitores de língua inglesa (como o ator Mark Ruffalo, que apoiou Silva até ele aprendido que ela era uma cristã evangélica que se opunha ao casamento entre pessoas do mesmo sexo) poderia ser desculpada por pensar que tinha uma chance. Todas as tribunas do capitalismo financeiro – como O Wall Street Journal e Financial Times— tinham se alinhado atrás dela, sem fôlego, e ninguém mais do queO economista. Sob manchetes como “O Cirurgião Silva, ""A Medida da Marina", E"Os tempos estão mudando”, a revista vendeu suas virtudes. de Londres vezes foi chamadapor uma “mudança de regime” brasileira.
Marina Silva é impressionante. Nascido em uma família pobre de seringueiros em um remanso da Amazônia, Silva é descendente de africanos e teria sido a primeira pessoa negra a liderar o Brasil. Como ministra do Meio Ambiente de Lula, ela teve um bom histórico de desaceleração do desmatamento da Amazônia e de promoção de um ambientalismo de classe que reconhecia que a floresta tropical é um lugar onde as pessoas pobres vivem e trabalham. Mas nesta eleição, ela se distanciou de seu passado ativista e se alinhou com as indústrias agrícola e financeira do Brasil.
A cultura política do Brasil é complicada, para dizer o mínimo. É preciso ser cauteloso ao mapear um continuum esquerda-direita, especialmente aquele baseado na política dos Estados Unidos. Há muitos activistas empenhados que romperam com o PT por causa da corrupção e da política económica e que se absterão na segunda volta. E a queda de Silva teve, sem dúvida, algo a ver com o motivo menos progressista: o racismo.
Silva, porém, passou a representar amplamente “a direita”, pelo menos em termos económicos, prometendo orçamentos apertados, taxas de juro elevadas (para manter os mercados obrigacionistas satisfeitos) e a perspectiva de alinhar o Brasil mais estreitamente com o comércio dos EUA. The Economist espera a sua candidatura assinala a “mudança da maré política na América do Sul após uma dúzia ou mais de anos de hegemonia esquerdista”.
Talvez. Além da próxima segunda volta do Brasil, estão a aproximar-se eleições importantes na Argentina, no Uruguai e na Bolívia – e só nesta última é que a esquerda tem uma vitória garantida. Mas por enquanto – assumindo que Dilma Rousseff vença – parece que a maior economia da região e a sétima maior do mundo continuará a ser governada pelo Partido dos Trabalhadores (PT).
Um segundo mandato de Dilma Rousseff será especialmente importante no domínio dos assuntos internacionais. Desde que chegou ao poder em 2003 com Lula, o PT tem conduzido uma política externa bastante independente de Washington. Primeiro sob Lula e depois Dilma, a diplomacia de Brasília não tem sido “radical”. Não é Havana que na década de 1960 semeou movimentos insurgentes em toda a América Latina ou que na década de 1970 enviou dezenas de milhares de soldados para a África Austral para derrubar a supremacia branca apoiada por Washington. E não foi um confronto. Não é Hugo Chávez que se levanta na ONU e afasta o persistente cheiro de enxofre de George W. Bush.
Mas como centro de gravidade económico da região e um membro importante dos chamados países BRIC, o Brasil tem sido absolutamente indispensável na oposição a Washington no comércio, na guerra e na vigilância. Nas Nações Unidas, por exemplo, em 2004, o Brasil e a Argentina deram o passo sem precedentes de partilhar o assento de dois anos reservado aos membros temporários latino-americanos do Conselho de Segurança (o Brasil sentou-se no primeiro ano, a Argentina no segundo). A cooperação continuou. A Argentina detém actualmente o assento e o Brasil apoiou os seus esforços para abrandar a pressa de Washington para a guerra na Síria (ou seja, pela primeira vez, no Outono de 2013). E trabalhou com a Alemanha para promover uma resolução da Assembleia Geral sobre “O direito à privacidade na era digital”, destinado a controlar a espionagem da NSA. O Brasil também aprovou uma lei nacional semelhante “Declaração de Direitos Digitais” (Forbes reclama que a lei está “quebrando a Internet”, enquanto um dos pioneiros da Internet, Tim Berners-Lee, diz a lei “desencadeará uma nova era – na qual os direitos dos cidadãos de todos os países serão protegidos”).
Se não fosse pelas manobras muitas vezes silenciosas do Brasil ao longo dos últimos treze anos, Washington teria tido vantagem em uma série de questões que teriam tornado o mundo um lugar mais sórdido e mais instável.estendendo o seu programa extraordinário de entregas e torturas, por exemplo, isolando Cuba e Venezuela, implementando uma Lei Patriótica em todo o hemisfério, ou institucionalizando o poder corporativo em “Área de Livre Comércio das Américas.” Os telegramas diplomáticos divulgados pelo Wikileaks há alguns anos dar uma boa janela para como os diplomatas brasileiros descarrilaram suavemente a agenda hemisférica dos Estados Unidos; muitas vezes, os enviados de Washington já estavam fora da sala antes de realizado eles foram jogados. Lula reconhecidoA reivindicação da Palestina de um Estado dentro das suas fronteiras de 1967 e Dilma raio contra o uso desproporcional da força por parte de Israel no seu recente ataque a Gaza.
No início deste ano, a administração Obama esperava que a Organização dos Estados Americanos agredisse a Venezuela, devido à resposta do seu governo aos protestos de rua. Mas Dilma reconhece um duplo padrão quando o vê. Em 2013, ela enfrentou protestos significativamente mais massivos do que qualquer outro ocorrido na Venezuela, contra os quais as suas forças de segurança reagiram. brutalmente. O Brasil, porém, não sofreu com Washington. Por isso ela defendeu a Venezuela: “A Venezuela tem uma história própria. Não cabe ao Brasil dizer-lhe o que fazer, pois isso violaria a nossa política externa. O Brasil não comenta a situação interna de nenhum país”, ela dito; “Para o Brasil é muito importante olhar sempre para a Venezuela do ponto de vista das suas conquistas, através de tudo isso, na área de educação e saúde.”
O Brasil está constantemente assaltado por especialistas dos EUA por não terem “defendido os princípios da ONU”, ou os valores da OEA, por não se juntarem aos chacais para perseguir o inimigo do momento, seja ele a Venezuela, a Líbia, a Síria ou a Rússia. Na verdade, não o fazer é precisamente sustentar os princípios fundadores dessas organizações, incluindo a não agressão, o multilateralismo e a soberania. A Venezuela está actualmente a concorrer sem oposição para ocupar o lugar não permanente no Conselho de Segurança reservado à América Latina, reflectindo uma unidade regional que teria sido posta em perigo com uma vitória de Silva (a sua plataforma de política externa apelava a relações muito mais estreitas com os Estados Unidos no comércio e segurança).
O Brasil, com certeza, tem seus próprios interesses. O país coopera com a Argentina na ONU, masquer Está próprio assento permanente no Conselho de Segurança. E Dilma Rousseff, lidando com problemas económicos e exigências sociais a nível interno, tem mantido um perfil mais discreto do que Lula e trabalha com Washington, comprometendo-se quando necessário (alguns sentiram que a resolução da ONU sobre privacidade foi diluída).
Mas não há dúvida de que Hillary Clinton, imaginando qual será a sua política externa quando entrar na Casa Branca, preferia ter Marina Silva (para não falar de Neves) do que Dilma Rousseff em Brasília.
ATUALIZAÇÃO - terça-feira, 7 de setembro, 10h30: Mark Healy defende um bom argumento: a direcção da influência dos mercados financeiros foi invertida desde que Lula foi repetidamente atacado pelos mercados financeiros. Agora, é provável que Wall Street e a City se inspirem muito mais em São Paulo do que o contrário, e que o Silva Boom foi fortemente promovido pelo complexo bancário-mídia-empresarial do Brasil, ao qual o The Economist e todos se juntaram com entusiasmo. Penso que está certo, embora tenha tendência a presumir um “mercado financeiro” global com diferentes centros regionais, com influência a mover-se em múltiplas direcções simultaneamente. O facto de todo o aparelho ter o nome de “Wall Street” é um vestígio histórico, e já em 1956, o antigo presidente da Guatemala, protestando contra o golpe de Estado dos Estados Unidos em 1954 no seu país, abriu o seu livro, O tubarão e as sardinhas, com estas perguntas: “Wall Street, onde começa? Onde isso termina?
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