Fonte: The Guardian
A Colômbia elegeu o ex-guerrilheiro Gustavo Petro como presidente, tornando-o o primeiro chefe de estado de esquerda do país sul-americano.
Petro derrotou Rodolfo Hernández, um ex-prefeito de Bucaramanga e magnata empresarial propenso a gafes, com 50.47% dos votos no segundo turno no domingo e assumirá o cargo em julho em meio a uma série de desafios, entre os quais o crescente descontentamento com desigualdade e aumento do custo de vida. Hernández teve 47.27%, com quase todos os votos apurados, segundo resultados divulgados pelas autoridades eleitorais.
A eleição de Petro marca uma mudança de maré para a Colômbia, um país que nunca teve um presidente de esquerda e segue vitórias semelhantes para a esquerda no Peru, Chile e Honduras.
“Hoje é uma festa para o povo”, tuitou o candidato vitorioso na noite de domingo, após a divulgação dos resultados. “Que tantos sofrimentos sejam atenuados pela alegria que hoje inunda o coração da pátria”.
Durante o seu discurso de vitória, Petro fez um apelo à unidade e estendeu um ramo de oliveira a alguns dos seus críticos mais duros, dizendo que todos os membros da oposição serão recebidos no palácio presidencial “para discutir os problemas da Colômbia”.
“Deste governo que está a começar nunca haverá perseguição política nem perseguição legal, só haverá respeito e diálogo”, disse, acrescentando que ouvirá não só aqueles que levantaram as armas mas também “aquela maioria silenciosa de camponeses, indígenas, mulheres, jovens”.
O presidente conservador cessante, Iván Duque, parabenizou Petro logo após o anúncio dos resultados, e Hernández rapidamente admitiu a derrota.
“Hoje a maioria dos cidadãos escolheu o outro candidato. Como disse durante a campanha, aceito os resultados desta eleição”, disse Hernández num vídeo publicado nas redes sociais. “Espero sinceramente que esta decisão seja benéfica para todos.”
O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, felicitou “o povo da Colômbia por fazer ouvir a sua voz numa eleição presidencial livre e justa”.
“Esperamos trabalhar com o presidente eleito Petro para fortalecer ainda mais a relação EUA-Colômbia e levar as nossas nações a um futuro melhor”, disse ele num comunicado.
O presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador, classificou a vitória da ex-guerrilha como “histórica”. “Os conservadores da Colômbia sempre foram tenazes e duros”, tuitou López Obrador.
A jornada de Petro de combatente do exército guerrilheiro M-19 na década de 80 até presidente também o levou a se tornar senador e prefeito da capital, Bogotá. Ele tem uma reputação de discursos sinuosos e arrogância.
A vice-presidente do Petro será Francia Márquez – premiada defensora dos direitos humanos e ambientais – marcando a primeira vez que uma mulher negra ocupa o cargo.
“Hoje todas as mulheres ganham” twittou Márquez quando as urnas fecharam na tarde de domingo. “Estamos enfrentando a maior possibilidade de mudança dos últimos tempos.”
“A história foi quebrada porque desde que nos tornamos uma república e conquistamos a independência, há 200 anos, nada parecido aconteceu”, disse Andrés Felipe Barrero, um apoiador do Petro.
“Estou muito feliz com a eleição do novo presidente. Marca completamente a mudança que esperamos, embora seja um pouco parcial, é a mudança que esperávamos”, disse Diego León, que também votou no Petro.
“É realmente um novo momento para a Colômbia”, disse Luis Eduardo Celis, que trabalha na Fundação para a Paz e Reconciliação, um grupo de reflexão colombiano. “Uma Colômbia que tem muitas pendências para avançar: uma reforma agrária, uma economia a serviço do povo, uma tributação mais equitativa, para sair da fome, da pobreza, para acabar com toda essa violência.”
Hernández parecia ser um candidato, embora não conseguia escapar de um fluxo quase constante de escândalos. Ele se referiu a Hitler como um “grande pensador alemão” e foi filmado tagarelando com modelos em um iate em Miami. Suas postagens no TikTok – de onde dirigiu grande parte de sua campanha – estavam carregadas de palavrões e ele se recusou a participar de qualquer debate antes da votação de domingo.
Na agenda do novo líder estará o vacilante processo de paz do país com os rebeldes de esquerda das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), que foi assinado em 2016 e encerrou formalmente cinco décadas de guerra civil que matou mais de 260,000 mil pessoas e deslocou mais de 7 milhões. Duque foi acusado de retardar a implementação do acordo para prejudicá-lo.
Outra dor de cabeça para Petro será a vizinha Venezuela, que há anos está atolada em crises sociais, políticas e económicas. Petro defendeu a reabertura dos laços com o homem forte venezuelano Nicolás Maduro, contrariando a política de isolamento do governo Duque.
A Petro também se comprometeu a libertar o país da dependência dos combustíveis fósseis, preocupando os investidores.
A eleição foi muito disputada, com muitos observadores a categorizar a corrida entre dois relativamente estranhos como uma repreensão mais ampla contra a classe política. Uma série de políticos tradicionais foram depostos no primeiro turno.
Com a Reuters e a Associated Press
Joe Parkin Daniels é um jornalista britânico radicado em Bogotá, Colômbia, onde cobre direitos humanos, conflitos internos do país e saúde. Ele twitta em @joeparkdan
ZNetwork é financiado exclusivamente pela generosidade de seus leitores.
OFERTAR